O Ministério Público Federal
em Brasília informou nesta sexta-feira (9) que denunciou à Justiça o
ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e o filho dele Luiz
Cláudio Lula da Silva pelos crimes de tráfico de influência, lavagem de
dinheiro e organização criminosa. A denúncia foi apresentada no âmbito da
Operação Zelotes.
De acordo com o MPF, a
denúncia foi feita após as investigações apontarem indícios de envolvimento do
petista e de seu filho, além de Mauro Marcondes e Cristina Mautoni – que também
foram denunciados – em negociações apontadas pelos investigadores como
irregulares e que levaram à compra de 36 caças do modelo Gripen pelo governo
brasileiro.
Também há, segundo o MPF,
indícios de irregularidades na prorrogação de incentivos fiscais destinados a
montadoras de veículos por meio de uma medida provisória. É a quarta denúncia
apresentada contra Lula, a primeira no âmbito da Operação Zelotes. Caso a
denúncia contra Lula seja aceita, será a quarta ação penal em que o
ex-presidente figurará como réu.
Versão
dos denunciados
O Instituto Lula informou por
telefone que não tem conhecimento da denúncia e que os advogados do
ex-presidente responderão assim que souberem do teor da acusação.
Contatado pelo G1, o advogado de Mauro Marcondes
e Cristina Mautoni, Roberto Podval, afirmou que a denúncia tem motivação
política, visando atingir o ex-presidente Lula.
“Não vi absolutamente nada
que levasse a qualquer irregularidade na compra dos caças. [...] Isso é factóide,
criado por quem tem interesse em processar o ex-presidente Lula. Para chegar
nele, tem que passar pelos Marcondes. Lamento que as acusações, denúncias,
feita sem seriedade. Qualquer um chega à conclusão que não há elemento”, disse.
O advogado confirma que a
companhia sueca Saab, que vendeu os caças ao governo brasileiro, contratou o
escritório do casal, mas somente para representa-la no Brasil, sem qualquer
crime.
O G1 buscava contato com a
defesa do filho de Lula até a última atualização desta reportagem.
Denúncia
Segundo o MPF, os supostos
crimes foram praticados entre 2013 e 2015, quando Lula já era ex-presidente.
O Ministério Público afirma
que ele integrou um esquema que visava beneficiar empresas automotivas,
clientes da Marcondes e Mautoni Empreendimentos e Diplomacia LTDA (M&M). De
acordo com as investigações, o ex-presidente prometia interferir junto ao
governo federal para beneficiar as empresas.
Em troca, o casal Mauro
Marcondes e Cristina Mautoni, donos da M&M, teriam repassado ao filho de
Lula pouco mais de R$ 2,5 milhões, sem que a empresa dele tivesse prestado
qualquer tipo de serviço à companhia do casal.
Veja abaixo por quais crimes
cada um dos quatro envolvidos foram denunciados:
·
Luiz Inácio
Lula da Silva – tráfico de influência
(três vezes), lavagem de dinheiro (nove vezes), organização criminosa;
·
Luis Cláudio
Lula da Silva – lavagem de dinheiro
(nove vezes) e organização criminosa;
·
Mauro
Marcondes – tráfico de influência (três vezes),
lavagem de dinheiro (nove vezes), organização criminosa e evasão de divisas
(uma vez);
·
Cristina
Mautoni – tráfico de influência ( três vezes),
lavagem de dinheiro ( nove vezes), organização criminosa e evasão de divisas
(três vezes).
O MPF diz na denúncia ter
encontrado indícios da existência de “uma relação triangular” entre os
investigados formada por clientes da M&M (que aceitaram pagar cifras
milionárias por acreditar na promessa de que poderiam obter vantagens do
governo federal"; pelos intermediários (Mauro Marcondes, Cristina Mautoni
e Lula); e pelo agente público que poderia tomar as decisões que beneficiariam
os primeiros (a então presidente da República Dilma Roussef).
Durante as investigações, porém,
não foram encontrados indícios de que Dilma tivesse conhecimento do esquema
criminoso.
Para os procuradores que
assinam a ação, "não há dúvidas" de que, pelo menos a partir de
setembro de 2012, Lula tinha conhecimento da estratégia utilizada por Mauro
Marcondes (de
vender a ideia de ele mantinha relação de proximidade com o ex-presidente às
empresas) e que viu nesse fato a oportunidade de garantir o
enriquecimento do filho.
A acusação tem base na análise de
documentos apreendidos por ordem judicial - tanto na Zelotes quanto na Lava
Jato -, além de informações prestadas em depoimentos, como o do próprio
ex-presidente Lula e de um representante da SAAB no Brasil, Bengt Janér.
Entre as
declarações feitas pelo executivo da Quadricon, que, durante um período era
contratada pela companhia sueca, está a de que, a partir de 2009, o processo de
compra dos aviões tornou-se mais político do que técnico. Um Procedimento
Investigatório Criminal (PIC), instaurado na Divisão de Combate à Corrupção, do
Ministério Público Federal do Distrito Federal, para apurar a compra dos caças
também serviu de base para a ação.
Na denúncia, a
Procuradoria sustenta que a promessa de interferência no governo por parte do
ex-presidente Lula (venda de fumaça) rendeu ao seu filho, Luis Cláudio o
recebimento de vantagens indevidas e que o valor repassado só não foi maior por
causa da deflagração da Zelotes, em março de 2015. Segundo a ação, a
expectativa era de um recebimento total de R$ 4,3 milhões, sendo R$4 milhões da
M&M e o restante da montadora Caoa. Entre os meses de junho de 2014 e março
de 2015, a M&M fez nove pagamentos à LFT que somados chegaram a exatos R$
2.552.400,00.
Compra dos caças. Em
relação aos caças, a ação do Ministério Público Federal detalha o processo
que durou oito anos. O edital para a compra - considerada a maior aquisição
militar da América Latina e que viabilizaria o chamado Projeto FX -2 - foi
lançado em 2006. No entanto, apenas em 2014, o governo brasileiro firmou
contrato com a empresa SAAB para o fornecimento das aeronaves. A empresa sueca
teve como concorrentes um modelo francês (Rafale) que, em 2009, chegou a ser
anunciado como vencedor da licitação pelo então presidente Luiz Inácio Lula da
Silva - e um americano (Super Hornet) - que por algum tempo (2011 e meados de
2012), foi o preferido da presidente Dilma Roussef. Em declarações dadas ao
Ministério Público Federal, o representante da SAAB afirmou que, nesse período,
a empresa acreditou que seria preterida pelos americanos."Joguei a
toalha", disse Bengt Janér.
O que se viu,
no entanto, foi uma nova investida por parte da empresa sueca que já possuía um
contrato indireto com a M&M (via Quadricon) e que, em agosto de 2012,
passou a trabalhar diretamente com os brasileiros. As investigações realizadas
por integrantes da força-tarefa da Zelotes revelaram que, ao todo, a M&M
recebeu da SAAB EUR 1,84 milhão, sendo EUR 744 mil apenas entre 2011 e 2015. A
explicação para esse reforço nos pagamentos está, segundo os investigadores, no
fato de os lobistas Mauro e Cristina terem convencido os suecos que possuíam
proximidade com o ex-presidente e que poderia contar com a sua influência junto
ao governo para assegurar uma vitória na disputa concorrencial."Assim,
argumentos técnicos e indicadores de eficiência tornaram-se meros detalhes
diante das jactadas proximidade e amizade a agentes públicos federais",
pontuam os autores da ação.
O Ministério
Público Federal enviou à Justiça documentos que não deixam dúvida quanto à
estratégia adotada pela M&M para convencer os parceiros da SAAB que poderia
contar com o prestígio do ex-presidente para interferir na decisão
governamental. Entre as provas, estão cartas endereçadas a Lula em, pelo menos,
duas ocasiões. Uma delas foi elaborada em setembro de 2012 e recebeu o aval dos
diretores da SAAB, na Suécia, antes de ser entregue ao destinatário. No texto,
uma espécie de defesa dos caças produzidos pela empresa sueca. A ação penal
também faz referência a uma intensa troca de e-mails entre funcionários da M&M
e do Instituto Lula, com o objetivo de viabilizar um encontro entre Lula e o
líder do Partido Sindical Democrata e futuro primeiro-ministro da Suécia Sueco,
Stefan Lofven. Documentos apreendidos na sede do Instituto Lula, em São Paulo,
revelaram ainda a intenção do político sueco, que defendia a escolha do modelo
fabricado pela SAAB, de se reunir com o ex-presidente Lula e a então presidente
Dilma Rousseff na África do Sul, por ocasião do funeral de Nelson Mandela. Em 9
de dezembro de 2013 Lula e Dilma viajaram até o país africano com o objetivo de
acompanhar a cerimônia fúnebre e, exatamente nove dias depois, em 18 de
dezembro, o governo brasileiro anunciou a decisão de comprar de 36 caças do
modelo Grippen. Era o fim de uma longa disputa e a vitória do cliente da
M&M.
Medida Provisória. As
investigações da Operação Zelotes revelaram que, assim como em 2010 - quando
foi negociada e aprovada a Medida Provisória 471-, do fim de 2013 até meados de
2014, a Marcondes e Mautoni agiu de forma irregular para garantir a aprovação
da MP 627. Um dos artigos, incluídos pelo relator, o então deputado federal
Eduardo Cunha, atualmente preso em Curitiba, garantiu a prorrogação de
incentivos fiscais às montadoras MMC e Caoa até 2020, contrariando a posição
técnica do Ministério da Fazenda. A partir da análise dos documentos
apreendidos na fase preliminar da investigação, o MPF sustenta que o casal usou
- nesse episódio - o mesmo procedimento adotado na negociação dos caças (vendeu
a promessa de influência política de Lula) para convencer os clientes a
firmarem contratos milionários como a M&M. Durante o processo de tramitação
da MP 627, MMC e Caoa pagaram R$ 8,4 milhões, cada uma, à empresa de Mauro
Marcondes.
Um documento
manuscrito apreendido pela Polícia Federal na sede da Marcondes & Mautoni
comprova a intenção de vender a influência. A anotação traz os nomes dos
presidentes da Caoa e da MMC, Antônio dos Santos Maciel Neto e Robert de Macedo
Soares Rittscher, respectivamente. Há ainda referências aos então ministros
Guido Mantega (Fazenda) e Aloisio Mercadante (Casa Civil) e à presidente da
República, como as pessoas que dariam a "canetada", ou sejam,
permitiriam ou não a prorrogação do benefício.
A ação penal
faz ainda referências a outros documento, também apreendido por ordem judicial,
que registra a existência de "coisas contrárias" à aprovação da MP
627. O texto diz que a Fazenda está "trancando tudo" e cita, como
justificativa para a resistência técnica à renúncia fiscal, o contexto
econômico-fiscal desfavorável e a preocupação com a avaliação das agências de
classificação de riscos. Há ainda a comprovação documental que, nesse período,
Mauro manteve com os clientes uma intensa negociação e troca de mensagens
acerca da discussão da MP no âmbito do Congresso Nacional. Paralelamente a
esses contatos, o lobista encontrava-se pessoalmente com Lula para, segundo os
investigadores, acertar os pagamentos pelo tráfico de influência. Um deles
ocorreu poucos dias antes da inclusão do artigo 100 no texto da MP por Eduardo
Cunha. Na ação penal, os procuradores da República lembram que no fim de 2015,
Mauro e Cristina foram denunciados pelo MPF pela prática de crimes durante a
tramitação da MP 471. Em maio deste ano, o juiz federal Vallisney Oliveira
condenou Mauro Marcondes a 11 anos e 8 meses de reclusão por associação
criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro). No caso de Cristina, a pena
imposta foi de 6 anos e 8 meses de prisão. (ação penal 0070091132015 4013400).
Caberá ao mesmo magistrado apreciar a denúncia referente ao caso dos caças e da
MP 627.
Negociação financeira. O
contrato entre o governo brasileiro e a empresa SAAB , no valor de U$5,4
bilhões, foi assinado em outubro de 2014. Já a Medida Provisória 627 foi
convertida na Lei 12.973, sancionada em maio do mesmo ano. Documentos reunidos
pela Força Tarefa revelaram que, nesse período, houve uma intensa movimentação
entre os envolvidos. O período marca também o início dos repasses financeiros
da M&M às empresas de Luiz Cláudio ( junho de 2014). Há registros, por exemplo,
de que o filho do ex-presidente esteve em quatro ocasiões na sede da M&M e
de que Lula, o filho e Mauro Marcondes se encontraram, também, quatro vezes no
Instituto Lula. Os encontros, avaliam os procuradores, serviram para que fosse
acertada a viabilização do pagamento das vantagens indevidas. Uma das provas é
a constatação de que as minutas dos contratos foram elaboradas quase dois meses
após a data informada como tendo sido a de assinatura dos documentos.
Fonte G1 e msn.com
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